Massacre em Suzano: Para especialistas, mais armas só trazem mais mortes
O crime cometido por dois jovens em uma escola pública de Suzano (SP), na manhã de ontem, alimenta argumentos de defensores e opositores da facilitação do porte e posse de armas. Especialistas em segurança pública ouvidos pelo UOL afirmam que, caso Guilherme Taucci Monteiro, 17, e Luiz Henrique de Castro, 25, tivessem acesso a mais armas, a tragédia seria maior.
"O fato de só um ter um revólver, mostra a dificuldade que eles [os assassinos] têm de acessar armamento. Aí a conta é muito simples: quanto mais você tem arma, mais homicídios acontecem, porque o poder de letalidade aumenta", diz Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
"Tanto eles não tinham acesso fácil, que precisaram encontrar soluções alternativas", comenta, fazendo referência à besta (arma com flechas e gatilho para disparo) e a uma machadinha usadas pelos assassinos. Uma das vítimas foi até o hospital com a machadinha cravada no ombro direito.
Ao todo, oito pessoas morreram executadas pelos jovens, que se mataram após atacar funcionários e alunos. Eles detinham uma pistola calibre 38, uma besta, uma machadinha e um arco e flecha.
"Política desarmamentista fracassou", diz senador
Nas redes sociais e em entrevistas à imprensa, o senador Major Olímpio (PSL-SP) manifestou que a "política desarmamentista fracassou". Para ele, reconhecido defensor da liberalização das armas, se houvesse cidadãos armados no interior da escola, como professores, "a tragédia seria minimizada".
O argumento usado pelo senador é o de que armas clandestinas circulam pelo Brasil e são usadas para esse tipo de crime, como explicou em entrevista à Folha. Ainda não se sabe a origem do armamento usado no episódio de Suzano.
Ilona Szabó, diretora-executiva do Instituto Igarapé, discorda de Major Olímpio e chama de "fazer justiça com a própria mão" a possibilidade de armar a população.
Tem um equívoco muito grande hoje de parte de nossos representantes quererem que a gente vire assassinos em potencial. Não somos nós cidadãos que temos que fazer justiça com as próprias mãos. Precisamos de um governo, de representantes eleitos, cumprindo uma agenda de segurança pública que proteja os cidadãos. Isso é obrigação número um de governantes eleitos num estado democrático de direito, e não terceirizar essa responsabilidade para nós.
Ilona Szabó, diretora-executiva do Instituto Igarapé
A comparação com os Estados Unidos é inevitável para os pesquisadores. O país é palco de dezenas de ataques com armas mensalmente - um número sem precedentes em qualquer país no mundo. Lá, os requisitos para se comprar armas são bem mais flexíveis do que no Brasil, e o debate para a mudança da legislação reacende a cada novo ataque.
"A gente vê que esses casos são muito mais comuns e frequentes lá, quase semanais, pelo simples fato de que você tem nos EUA um acesso muito maior a armas de fogo do que em qualquer lugar no Brasil", argumenta Bruno Langeani, especialista em segurança pública do Instituto Sou da Paz.
Mudanças recentes na legislação brasileira
Em janeiro, pouco após tomar posse, o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto que alterou a regulamentação do Estatuto do Desarmamento, facilitando a posse de armas no Brasil.
Segundo o decreto, cidadãos podem manter armas de fogo em casa, desde que tenham feito um curso para manejar arma, tenham mais de 25 anos, ocupação lícita e sem antecedentes criminais.
Para Szabó, a mudança não acarreta necessariamente em um risco de aumento de crimes como o de hoje. "A gente pode ter uma posse responsável sem impacto grandioso na violência. Depende muito de como o Estado vai enfrentar essa questão, se haverá controle para as armas não pararem em mãos erradas", diz.
Ela lembra da apreensão, realizada ontem, de 117 fuzis encontrados na casa de um amigo do suspeito de matar a vereadora Marielle Franco. Ronnie Lessa, acusado pelo crime, era ex-policial militar. "As armas nascem legais, são compradas legalmente e passam para a ilegalidade", diz.