Besta: venda de arco e flecha usado em massacre de Suzano não é monitorada
Além de um revólver calibre 38 e de um machado, os dois ex-alunos que provocaram um massacre hoje em Suzano (SP), utilizaram também uma besta - espécie de arco e flecha montado em uma coronha e acionado por um gatilho. No Brasil, conforme juristas ouvidos pelo UOL, não existem leis que proíbam o porte desse tipo de equipamento, tampouco normas que versem sobre a venda e a compra do instrumento.
As leis que regulamentam as armas no país não abrangem bestas e arco e flechas porque estes objetos não são considerados, tecnicamente, armas de fogo. "Não existe legislação específica sobre esse tipo de arma. Na verdade, é um instrumento que foi desviado de seu uso para cometer um crime", diz ao UOL a desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Ivana David.
Segundo a SSP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo), a motivação dos atiradores ainda é desconhecida. A perícia vai revelar quais foram os ferimentos de cada uma das vítimas. Ao menos 10 pessoas morreram (incluídos os executores) e 11 ficaram feridas.
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Tanto a besta quanto o arco e flecha são consideradas armas brancas e utilizadas em clubes esportivos. Segundo a desembargadora, havia anteriormente uma previsão para contravenção penal para a posse arma branca, como facas, por exemplo. A possibilidade de contravenção, no entanto, foi suprimida, e hoje não existem leis que proíbam o porte e a posse desses objetos.
O UOL entrou em contato com algumas lojas que vendem esse tipo de equipamento, e os estabelecimentos afirmaram que, mesmo sem leis específicas sobre a questão, não vendem para menores de 18 anos. Dois vendedores de duas lojas diferentes afirmaram à reportagem que consultam os dados dos compradores na Receita antes de aprovar a aquisição das armas.
"Você não precisa pedir autorização para a Polícia Federal, você não tem de obter nenhum documento específico para portar esse tipo de arma, não exige nada. O máximo que se sabe é uma orientação para que as pessoas que pratiquem esportes com essas armas carreguem com elas uma carteirinha ou um ofício do clube onde atuam. Mas, mais uma vez, isso não está na lei", diz David.
Em sites de comércio virtual, no entanto, existe a possibilidade de se comprar uma besta (também chamada de balestra) e arcos e flecha profissionais sem qualquer restrição. Diversos tipos de modelos estão à venda, tanto portáteis quanto mais robustos, e os preços podem chegar a mais de R$ 3 mil.
Lei para controlar arma em SP não foi aprovada
Em outubro de 2016, o assassinato de um catador de materiais recicláveis por um homem com uma besta impulsionou a criação de uma lei para regulamentar a compra e venda dos objetos.
À época, Denis Young Kim, de 33 anos, foi acusado de ter matado Ademir Ribeiro Pontes, de 64 anos, com uma flechada no pescoço. Menos de um mês depois, o deputado estadual Orlando Bolçone (PSB) apresentou um projeto que propunha o controle da venda de bestas e arcos e flechas profissionais.
A ideia do projeto era proibir a venda desses produtos no varejo para menores de 18 anos, além de fazer um registro documental de todos os compradores.
"O varejista deverá anotar os dados pessoais do comprador, bem como seu endereço de residência, telefone e, se o mesmo possuir, endereço eletrônico", diz um dos parágrafos do projeto.
O projeto, no entanto, está parado para vistas desde dezembro do ano passado e dificilmente será aprovado. Isso por que a competência para legislar sobre "material bélico" é exclusivamente da União, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal.