Procuradores apoiam tipo de acordo citado por Moro e citam EUA como exemplo
O presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), José Robalinho Cavalcanti, rebateu críticas de que o "plea bargain" (o termo técnico em português é "acordo penal") servirá para condenar até inocentes, como verificado por estudos psicológicos nos Estados Unidos. "Seria e será feito diante de um juiz e com ampla participação de um advogado, e não em algum canto escuro com ele apanhando ou confessando por pavor", disse ele ao UOL.
A proposta está em estudo pelo ministro da Justiça, Sérgio Moro, e vai constar dentro do projeto anticrime que o governo pretende enviar ao Congresso a partir de fevereiro. A associação, que reúne os procuradores do MPF (Ministério Público Federal), defende a medida.
Os processos de vários crimes - como homicídios, assaltos e estupros - seriam encerrados após confissão do investigado perante a promotoria. Em troca, ele obteria uma pena menor, de maneira semelhando com o que acontece na colaboração premiada, mas sem envolvimento de organização criminosa. Robalinho contou que pretende se reunir com Moro, preferencialmente este mês para debater a proposta antes de ela ser enviada ao Congresso. Ontem à noite, a ANPR divulgou nota em apoio à medida.
Alisson Redlich, professora de psicologia forense da Geórgia Mason University nos Estados Unidos, disse ao UOL que, "não é incomum para pessoas inocentes admitirem culpa". "Das condenações incorretas conhecidas nos EUA, cerca de 18% contêm falsos acordos, ou pessoas inocentes assumindo culpa", detalhou a psicológa. "Eu diria que a principal razão é porque a pessoa acredita que ela será condenada no tribunal e quer conseguir os benefícios do 'plea bargain'."
Para Robalinho, não é possível comparar o Brasil com a realidade norte-americana. "Colóquio flácido para bovino dormitar. Não estamos nos EUA. Aqui a lei é muito muito muito mais protetiva a defesa e ao réu. Terá todas as condições de negociar. O sistema brasileiro é o mais garantista do mundo e isso não seria nem arranhado por isso."
O procurador entende que haverá ganhos com o "plea bargain" para melhorar a velocidade da Justiça e reduzir a impunidade e a injustiça. "O que se permitiria é um estímulo inverso ao de hoje", avaliou Robalinho. "Hoje, mesmo que a pessoa seja inocente, tem todos os estímulos para apostar no processo e recorrer ao limite, para maximizar sua chance de se livrar acrescentando a chance de vencer pela prescrição [extinção do processo por de demora no julgamento."
Na outra ponta, em novembro de 2018, o Conselho Superior da Polícia, ligado à Polícia Federal, defendeu que a "investigação criminal não deve ser excluída com base em acordo de não persecução penal [exemplo: o 'plea bargain'] ou em acordo sobre matéria probatória não verificada pela polícia".
O temor é que o "plea bargain" substitua a investigação dos crimes. Assim, outros membros de um assassinato, por exemplo, poderiam deixar de ser punidos ou inocentes poderiam ser responsabilizados por causa de confissões parciais ou falsas, de acordo com uma fonte policial ouvida pelo UOL. Se o acordo ocorrer dentro da fase de investigação, nunca se saberia se a pessoa agiu sozinha ou integrava uma organização criminosa, aponta o investigador.