Quinta-feira, 2 de janeiro. O dia internacional da preguiça após o encerramento das festas de fim de ano. É também o momento perfeito para lançar um olhar crítico —e talvez um tanto rancoroso— sobre o que ficou para trás. Por isso, esta coluna de Splash traz uma lista fundamental: as grandes decepções de 2024.
A tarefa, no entanto, é árdua. Escolher apenas três perdedores não é simples, especialmente em um ano em que, como diria a filósofa, até quem ganhou, perdeu. Os últimos 12 meses foram duros para a mídia e o entretenimento, com gigantes do setor tropeçando em meio a rápidas transformações.
Paramount
De longe, a Paramount Global —de franquias como "Missão: Impossível", "Transformers", "Jornada nas Estrelas" e "Top Gun"— é aquela que mais ficou perdida em 2024. O conglomerado, que tem em sua estrutura canais de TV, streaming, estúdio de cinema e muito mais, se envolveu em um longo e doloroso processo de venda. Isso após anos de uma gestão fraca e com Shari Redstone, que herdou o grupo do pai, Sumner Redstone, percebendo que era hora de sair do negócio.
Na prática, foram poucas as ofertas concretas, com Shari optando pela proposta feita pela Skydance Media, de David Ellison —também um herdeiro, mas de Larry Ellison, cofundador da big tech Oracle. O acordo, oficializado em julho, representa um investimento de cerca de US$ 8 bilhões (R$ 48 bilhões). Juntos, os dois estúdios terão um valor estimado em US$ 28 bilhões (R$ 170 bilhões).
Em meio a esse processo, o CEO da Paramount, Bob Bakish, acabou demitido. Foi substituído por um triunvirato, formado pelos presidentes das três divisões internas da companhia. Juntos, eles começaram uma gestão interina, focada em deixar tudo em ordem para os novos donos.
Acontece que, nos últimos meses, a fusão se tornou motivo de disputas no FCC, a Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos. Alguns acionistas acreditam que Redstone receberá mais que eles. Tem até o Sindicato dos Caminhoneiros, que se opôs ao plano de Skydance para cortar US$ 2 bilhões (R$ 12,3 bi) em custos —incluindo aí muitos empregos.
Tudo isso está adiando a aprovação da transação pelo órgão, que pode acabar ficando para o novo governo Trump —que começa em 20 de janeiro. E isso pode ser uma verdadeira bomba.
O presidente eleito está processando o canal CBS News, que faz parte da Paramount, em US$ 10 bilhões (R$ 61,8 bi) por "doutrina enganosa" na entrevista que Kamala Harris, então adversária nas eleições, deu ao programa 60 Minutes. De acordo com The New York Post, executivos do estúdio estão com medo de que isso interfira na decisão do FCC na próxima legislatura.
Enquanto isso, a Paramount Global vai ficar para trás. O Paramount+, por exemplo, conta com "apenas" 72 milhões de assinantes em todo o mundo. Marcas que, no passado, foram muito representativas —como MTV, Nickelodeon e Showtime— não conseguiram fazer a sua transição para o digital. Em termos de estrutura, o grupo ainda separa suas divisões de cinema e vídeo sob demanda em diferentes silos. Até a Pluto TV, antes considerada um exemplo de sucesso no modelo FAST (streaming gratuito com canais lineares), perdeu terreno.
Não por menos, as ações da companhia acumulam uma queda de quase 30%, mesmo que o Paramount+ tenha revertido os resultados financeiros negativos e passado a dar um pouco de lucro.
David Ellison, que vem de um contexto criativo e tem um pé no mundo da tecnologia, vai precisar suar bastante para extrair o máximo desse tradicional estúdio.
TV por assinatura tradicional
A esta altura, o fim da TV paga é notícia velha. Mesmo assim, 2024 conseguiu reservar alguns pregos importantes para este caixão.
Há anos, os assinantes estão migrando dos modelos mais tradicionais, como cabo e satélite, para o streaming —seja em modelos sob demanda, como a Netflix, ou lineares, como a Zapping. Até as próprias operadoras tradicionais, como Claro e Sky, estão caminhando para o formato 100% via internet.
Contudo, as detentoras dos canais, conhecidas como programadoras —parte dos grandes conglomerados de Hollywood— não estão conseguindo realizar essa transição, o que as faz perder fontes de receita essenciais.
O exemplo maior é a Disney. A partir de fevereiro, a companhia deixará de distribuir quase todos os seus canais lineares de TV no Brasil, mantendo apenas a ESPN. Nomes como Star Channel e Disney Channel vão chegar ao fim.
Nos Estados Unidos, a Comcast —que, curiosamente, vem do mundo das operadoras de TV— anunciou uma reestruturação. O braço de televisão paga da NBCUniversal, que contempla marcas como E! e CNBC, será separado em uma nova empresa. As redes ainda são rentáveis, mas o grupo acredita que o prognóstico negativo para esse mercado afeta a sua avaliação geral por parte dos investidores. Além disso, na visão deles, a nova empreitada poderá se posicionar melhor nesse mercado. Hoje, as emissoras estão presentes em 70 milhões de lares norte-americanos.
Até mesmo a Warner Bros. Discovery está tomando uma decisão parecida. A WBD anunciou recentemente que irá separar as suas iniciativas de televisão —incluindo Warner Channel, Discovery, TNT e Cartoon Network— dos outros negócios do estúdio. Isso pode significar um primeiro passo antes de uma divisão total, como a Comcast está fazendo, ou para uma venda.
Curiosamente, estamos presenciando um retorno ao passado: as emissoras por assinatura, antes operando de forma independente, tinham se integrado mais profundamente ao restante do negócio como uma resposta ao crescimento do streaming. Agora, essa separação volta a ganhar força, impulsionada pelo mesmo fenômeno que as uniu.
A esperança, contudo, é que esse movimento não represente o início de um "até que a morte os separe".
Venu, o grande streaming dos esportes
Em 6 de fevereiro de 2024, Disney, Warner Bros. Discovery e Fox Corporation anunciaram uma parceria histórica: a criação da Venu Sports, uma nova plataforma de streaming voltada ao mercado dos Estados Unidos.
Com lançamento previsto para o terceiro trimestre deste ano, o serviço reuniria sob um único guarda-chuva as transmissões esportivas de ESPN, TNT Sports e Fox Sports. Para o assinante, ficava a promessa de poder assistir às principais ligas dos EUA (como NFL e NBA) por uma única mensalidade de US$ 42,99 (R$ 261) e sem precisar ficar alternando apps. O foco seria no público que está deixando a TV paga tradicional, mas que não se adapta à miríade de opções do online.
No papel, tudo perfeito. Na realidade, o projeto esbarrou em questões regulatórias. Na Justiça, a concorrente FuboTV conseguiu que um juiz federal barrasse a empreitada de forma preliminar. O mais recente recurso contra a decisão foi negado, agora em dezembro, e o julgamento está marcado apenas para outubro de 2025.
No meio desse impasse, a iniciativa vem perdendo força. A Warner ficou sem os direitos de transmissão da NBA na TNT, enquanto a Netflix avança nesse segmento, conquistando espaço com os jogos de Natal da NFL e garantindo a transmissão das próximas duas Copas do Mundo de Futebol Feminino nos EUA.
Com o perdão do trocadilho, o Venu (que, em português, significa "local") parece estar perdendo seu espaço em 2025. Resta agora à Disney, Warner e Fox torcerem para não seguirem pelo mesmo caminho.
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