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'Vendia fotos dos pés e, quanto mais faturava, mais dor de cabeça tinha'

Letícia passou a vender fotos dos pés e se assustou com a repercussão - Arquivo pessoal
Letícia passou a vender fotos dos pés e se assustou com a repercussão Imagem: Arquivo pessoal
do UOL

Ludimila Honorato

De Universa, em São Paulo

23/11/2024 05h30

Foi por acaso que a empresária Letícia Vieira, 26, entrou para o ramo da podolatria e ganhou muito dinheiro vendendo fotos dos pés. Com a renda temporária, pagou rinoplastia, colocou silicone nos seios, comprou telefone e perfumes.

Mas, após um ano, interrompeu a atividade porque começou a ser perseguida e receber ameaças de morte, caso não saísse com os podólatras —pessoas que têm fetiche por pés. "É um mundo muito podre", disse a Universa.

'Cliente beijou meus pés'

Letícia trabalhava como vendedora em uma loja de shopping quando um homem se abaixou perto dela para pegar um produto e observou o pé dela. Perguntou quanto ela calçava e elogiou os pés.

Ele pediu para eu tirar meu sapato e perguntou se poderia beijar meus pés. Falei que não, ele ofereceu R$ 50. Sabia que ele ia dar muito mais, sou vendedora, trabalho há 13 anos no comércio, então ofertei mais e ele deu.
Letícia Vieira

A empresária contou esse episódio em um vídeo no TikTok, em que afirma ter cobrado R$ 100 para o cliente beijar e tirar algumas fotos apenas dos pés dela.

Uma semana depois, ela saiu com um rapaz que também era viciado em pés. "Eu não sabia, achava que ele queria sair comigo normal, porque tinha gostado de mim."

Letícia ganhou cerca de R$ 12 mil em 24 horas com perfil de fotos dos pés - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Letícia ganhou cerca de R$ 12 mil em 24 horas com perfil de fotos dos pés
Imagem: Arquivo pessoal

Juntos no carro para o date, ele parou no estacionamento e pediu para ver os pés de Letícia, que deixou. Depois, ela comentou sobre os episódios com alguns amigos em um grupo de WhatsApp, onde descobriu ter três podólatras, que explicaram do que se tratava.

Na mesma época, ela também fazia decoração de unhas e começou a publicar o resultado do trabalho em fotos dos próprios pés. Em vez de atrair o público feminino, que era o alvo, muitos podólatras apareceram, sem usar qualquer hashtag ou ferramenta de impulsão.

Quando um te acha, é como se todos te achassem. Eles compartilham essas fotos em grupos, eles estão por todos os lados: no Pinterest, no Facebook. É como se fosse uma máfia, uma rede. Letícia Vieira

Qualquer foto em seu perfil rendia de 700 a 900 curtidas, mas uma única foto do pé ia de 3 mil a 20 mil likes.

'Não é para qualquer um'

Letícia ganhava muitos seguidores por dia e mensagens de pessoas interessadas, então resolveu se aprofundar no ramo da podolatria. Buscou saber o que era o fetiche, o perfil dos adeptos, do que e como gostavam.

Quando sentiu que estava munida de todas as informações possíveis, foi para a prática. "Comecei a sair com pessoas que adoravam pés, porque eu precisava também de experiência", diz. Para ganhar dinheiro no ramo, não basta publicar fotos, é preciso entender do trabalho.

Não é para qualquer um, precisa ter conhecimento. Se tu não conhece, não gosta, não é para entrar, porque eles sabem quem gosta e quem não gosta. Eles também pagam para tu responder perguntas, principalmente contar experiências. E eles sabem quando está mentindo. Letícia Vieira

Em meados de 2020, com conhecimento, experiência e gosto, Letícia abriu um perfil privado no Instagram dedicado exclusivamente às fotos dos pés. Ela sabia que daria certo, mas não tanto.

Ela cobrava mensalmente de R$ 60 a R$ 70 para a pessoa entrar no perfil. Todas eram excluídas no fim de cada mês para terem de pagar novamente. As primeiras quatro horas foram "espantosas", e ela arrecadou mais do que seu salário como vendedora.

Letícia cobrava mensalmente de R$ 60 a R$ 70 para entrarem no perfil - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Letícia cobrava mensalmente de R$ 60 a R$ 70 para entrarem no perfil
Imagem: Arquivo pessoal

Em 24 horas, tinha mais de 200 pessoas seguindo, o que deu, em média, R$ 12 mil. "Contei para minha mãe e para o meu pai, eles também se assustaram e começaram a rir, porque era muito dinheiro em poucas horas apenas para ver o meu pé."

'Pé tinha de estar hidratado'

Além das fotos que publicava, Letícia também produzia conteúdos exclusivos, como imagens dos pés em posições específicas e vídeos. Ela cobrava R$ 380 por cinco a sete fotos que mostravam mais a sola ou o calcanhar.

"O pé tinha de estar sempre hidratado. Calcanhar rachado e pé encardido não vende", disse no TikTok, embora alguns podólatras peçam para sujar os pés. Já os vídeos de um minuto, com ela apenas caminhando e mostrando os pés, eram vendidos a R$ 600.

Com a exclusividade, chegaram pedidos inesperados. Um cliente tinha tara por pé quebrado e pagou para ela comprar uma bota ortopédica e tirar fotos dos pés e pernas imobilizados. "Óbvio que cobrei bastante."

Os fetiches iam além dos pés também. "Tem os homens que sentem prazer em ser cornos, então queriam que eu mandasse áudio fingindo estar com outra pessoa", relata. Alguns ligavam apenas para que ela desligasse na cara deles, pois gostavam de se sentir humilhados.

Na mesma linha, tinha um cliente que imaginava Letícia dirigindo um carro e passando com o veículo por cima das mãos dele. "São inúmeras coisas dentro da podolatria que envolvem outras áreas. Esses foram os mais bizarros."

'É um mundo podre'

Após oito meses, o Instagram derrubou o perfil de Letícia, com a alegação de nudez, embora só tivesse fotos dos pés. Ela acredita que tenha sido pelo conteúdo dos comentários. Depois de quatro meses desativada, ela criou uma nova conta, que durou quatro meses e foi novamente desativada.

"Depois disso, eu conheci meu marido, a gente se casou, e eu não precisei mais entrar para o mundo da podolatria, porque é um mundo muito podre", diz, ao relatar ter sido perseguida pelos adeptos do fetiche.

"Quanto mais eu faturava, mais dor de cabeça eu tinha", revelou em um vídeo no TikTok.

Um dia, ela recebeu mensagens de dez podólatras que a tinham visto jogando futebol descalça na orla do lago Guaíba, em Porto Alegre. "Eles falaram que me viram e tiraram muitas fotos minhas. Começou a ficar muito perigoso."

"Aquilo começou a me perturbar muito, parecia que todo lugar que eu ia, todo mundo reconhecia ou alguém estava me perseguindo ou olhando diferente", afirma. Letícia chegou a registrar dois boletins de ocorrência contra os seguidores que a ameaçaram de morte.

Com o dinheiro que conseguiu juntar nesse tempo, ela saiu do trabalho como vendedora e abriu a própria loja no ramo de joalheria de alto luxo. "Consegui viver minha vida de forma mais tranquila e anônima."

Mas ela cogita abrir um novo perfil ou lançar um curso para quem deseja entrar no ramo. "É um meio que dá muito dinheiro se souber trabalhar com isso."

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