O brasileiro que viu a aurora boreal mais de 500 vezes: 'Um monstro verde'
Em pouco menos de três meses Marco Brotto deixará o Brasil para embarcar para mais uma viagem às terras do Ártico. Isso porque, no fim de agosto, a temporada de aurora boreal vai começar.
É assim a sua vida: oito meses fora e quatro aqui em sua terra natal — embora ele se sinta em casa toda vez que se depara com a dança de luzes no céu gelado.
Marco Brotto nasceu em Curitiba, é fotógrafo autodidata e empresário. Mas tem como profissão ser "caçador de auroras boreais'. Ele teve comércio de roupas, móveis, restaurante e até foi vice-presidente do time paranaense Coritiba Foot Ball Club durante os anos de 1996 a 2000.
Em 2008, pesquisado algumas informações sobre as luzes verdes, se deparou com um pacote imperdível de viagem e decidiu, literalmente, "pagar pra ver". Foram 10 dias de navio sem conseguir ver nada.
Porém, a frustração se transformou em teimosia. Quando finalmente conseguiu ver uma aurora, na Noruega, em 2011, não parou mais: já foram 123 expedições ao Ártico e (pelo menos) 500 auroras. Hoje, ele continua suas caçadas através de sua empresa de turismo que ajuda a levar brasileiros para ver as luzes do Norte.
A primeira sensação de ver uma aurora boreal foi de que tinha um monstro verde atrás de mim. Aí a minha saga começou"
Estados Unidos (Alasca), Canadá, Groenlândia, Islândia, Noruega, Suécia, Finlândia e Rússia são alguns lugares em que é possível observar as luzes do Norte e, para o caçador, ter que escolher um lugar predileto é como ter que escolher um filho favorito.
Ele diz que cada país tem sua peculiaridade e não há lugar melhor ou pior para conseguir ver a aurora na região em torno do Círculo Polar Ártico. Segundo Brotto, comparar os países só porque estão na mesma latitude é como querer comparar as praias do Brasil e da Austrália.
Gosto da vida através do Alasca, adoro as geleiras na Groenlândia, dos lagos no Canadá, a Suécia é maravilhosa, a Noruega tem os fiordes... e a Finlândia é a terra do Papai Noel. Cada lugar tem sua beleza".
Em sua percepção, o lugar mais desafiador é a Islândia. Isso porque o tempo muda de uma hora para outra — ou melhor, de um minuto para o outro — o que leva a muitas estradas fechadas e risco de segurança.
Mas uma coisa que todos os lugares têm em comum são os microclimas, que são pequenas zonas isoladas com características climáticas diferentes da própria região. Saber quais são os lugares que estatisticamente ficam com o céu mais limpo, o que aumenta a possibilidade de ver a aurora boreal, e ter isso planilhado é um dos segredos do tempero, diz ele.
O melhor jeito de ir à caça
"Gosto de brincar que o melhor lugar para ver uma Aurora é do meu lado", diz o aventureiro para quem está buscando ver as luzes. Isso porque Brotto não sossega até encontrá-las.
A dinâmica de caça desenvolvida por Brotto veio a partir do acesso a gráficos da Nasa, algo que começou a ser mais acessível na década passada. Na Noruega, por exemplo, são mais de 200 pontos de visualização mapeados pelo caçador.
A saída do hotel para ver a aurora pode acontecer de dois modos opostos: com várias horas de antecedência ou com um aviso de "esteja pronto em meia hora". O planejamento pode — e deve — mudar tão rápido quanto a previsão do tempo.
É preciso ainda um jogo de xadrez para determinar as horas de descanso do motorista, pois todos esses países seguem regras muito rígidas com relação a transporte e licença de direção. Se há a possibilidade de aurora diurna, Brotto planeja para a noite o descanso e vice-versa.
Mesmo estando sempre muito bem preparado e atento às condições climáticas, o viajante admite que às vezes a caça é intuitiva. "Na minha última viagem da Islândia todos os prognósticos eram contra e nós conseguimos ver", conta.
Segurança em primeiro lugar
Ir por conta própria de carro ou assumir o risco de uma tempestade, por exemplo, são coisas que o caçador dispensa — e não recomenda.
Um fato em comum é que todos os países do Ártico são muito bem estruturados. Embora o número de rodovias varie bastante entre os países: enquanto a Noruega, por exemplo, tem uma grande capilaridade, o Alasca tem apenas uma estrada.
Todavia, Brotto ressalta que nesses lugares não existe uma mão de obra com serviços de resgate ou postos de gasolina 24 horas à disposição.
Você vai ter que se virar. É diferente aqui do Brasil, onde você chama o resgate e eles chegam em poucos minutos. Lá estamos em regiões inóspitas"
"Por isso, se você não tiver muita experiência dirigindo na neve, pegar um carro por conta própria é muita irresponsabilidade", completa.
Como ele mesmo conta, perrengues podem acontecer por questões da natureza. Uma vez, chegou a ficar sete horas com um ônibus atolado por causa do vento, que levou o veículo um metro para dentro da neve — mas nunca por irresponsabilidade humana.
"Na Islândia às vezes você passa cinco horas dirigindo sem ter um posto de gasolina, é preciso estar preparado. Também nunca entro em uma área que não seja permitida", diz.
Brotto não tem vergonha de dizer que cansa de chorar vendo a aurora boreal toda vez, tanto pela sua emoção como por ver o sorriso de outras pessoas tendo seu sonho realizado.
Quando eu estou lá, realmente entro em outra dimensão"