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Contrariando estatísticas: advogada negra integra 0,98% dos pós-graduandos do país

Allyne Silva está iniciando mestrado na USP - Arquivo pessoal
Allyne Silva está iniciando mestrado na USP Imagem: Arquivo pessoal

Fernanda Fadel, <br>Do BOL

06/03/2016 08h31

Os últimos dados do Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) dão conta de que apenas 0,98% da população brasileira chega à pós-graduação; deste total, 28,9% são negros.

Considerando que o país é formado por maioria negra (53,6%), segundo o IBGE, esta realidade aponta para a desigualdade racial dentro do universo acadêmico. A carioca Allyne Andrade e Silva, de 30 anos, é uma das personagens vivas desse índice.

Doutoranda na USP (Universidade de São Paulo) e advogada formada pela UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), Allyne conta que vivenciou desde cedo as marcas do racismo no espaço escolar: "Por esforços dos meus pais, estudei em locais onde negros não eram a maioria e conflitos raciais entre colegas e professores sempre foram presentes. Não raro, as pessoas se surpreendiam com o nível da minha educação ou por eu não fazer parte de uma família desestruturada."

Em 2004, a carioca ingressou em Direito na UERJ, no 2º ano de existência das cotas raciais na instituição e viu de perto um "ambiente conturbado de desconstrução de estereótipos racistas". "Os professores mesmo afirmavam que a presença dos cotistas era uma ameaça a excelência acadêmica, o que nunca se confirmou", lembra.

Paralelo a isso, movimentos estudantis negros com força por legitimidade cresciam dentro da universidade, criando uma rede de ajuda e solidariedade entre os alunos.

Allyne Andrade e Silva - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
Allyne com os pais, na defesa de seu mestrado, em 2015
Imagem: Arquivo pessoal
Allyne crê que a igualdade racial é uma luta feita coletivamente e que o ingresso de estudantes negros na universidade é um passo importante nessa conquista: "A minha presença nesse espaço traz discussões e escancara privilégios e desigualdades que talvez não houvesse se não existisse uma mulher negra presente ali. A diversidade racial e social muda, dinamiza e enriquece a produção do saber universitário."

Em 2012, Allyne iniciou mestrado na USP (Universidade de São Paulo) e o próximo degrau ao "caminho para uma vida melhor" - incentivado pelos pais - é o doutorado, no qual ingressou pela mesma instituição, em 2016, buscando ampliar na advocacia a sua luta pelos direitos humanos.

A doutoranda defende que só a existência das cotas raciais não é suficiente para garantir um índice mais igualitário de negros na universidade. As medidas mais importantes vão do reforço de políticas públicas de educação, política de democratização de acesso e política de permanência:  "Estudar, mesmo em universidade pública, é caro. Sem políticas de alojamento, bolsas de pesquisa e extensão, boas bibliotecas, passe livre e restaurantes universitários, muitos alunos não conseguem se manter em seus cursos."

Almejando dias melhores, Allyne Andrade e Silva deixa seu recado: "Desejo profundamente que a próxima geração de negros não precise lidar com desigualdade racial, que não precise aprender a se defender de agressões racistas na mais tenra infância nem depois tenha que aprender a neutralizar a violência simbólica da nossa ausência na mídia e nos espaços de poder e representação."

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