Deputados querem sanções econômicas a empresas com casos de racismo
Deputados federais que acompanham a investigação da morte de João Alberto Silveira Freitas, homem negro de 40 anos que foi espancado em uma loja do Carrefour em Porto Alegre, querem um projeto de lei que imponha sanções econômicas a empresas com casos comprovados de racismo em suas dependências.
Os parlamentares defendem que, nesses casos, fiquem vetados subsídios públicos, isenção de impostos, licitações governamentais e empréstimos de bancos públicos. É estudada também a aplicação de multas e, em último caso, a cassação do alvará de funcionamento.
O coordenador da comissão que acompanha a morte de João Alberto, deputado Damião Feliciano (PDT-PB), afirmou que a prioridade é aprovar um projeto que mexa nos bolsos das empresas, pois, muitas vezes, a motivação para combater o racismo institucional e estrutural se torna maior somente quando há impactos financeiros, lamenta.
"Tenho certeza de que, na hora que tocarmos no bolso, os empresários vão instruir melhor seus funcionários. Não é só a questão da morte do cliente do Carrefour. Esse foi o caso extremo. Mas há constrangimentos como ser seguido pelo segurança", disse Damião.
"Não é revanchismo nem perseguição ao empresariado brasileiro. Só queremos contribuir com a diminuição do racismo
Damião Feliciano (PDT-PB), que chefia a comissão de deputados que acompanha o caso da morte de João Alberto
O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) afirma que a proposta tem o apoio unânime da comissão e esses pontos devem ser incluídos em projeto de lei de sua autoria sobre o tema para acelerar a análise.
O parlamentar quer votar o texto amanhã (2) no plenário da Câmara. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que poderá incluí-lo na pauta se o grupo conseguir o aval dos líderes da Casa para que tramite em regime de urgência.
"Não adianta responsabilizar o segurança, a atendente nem a empresa terceirizada que presta serviço para uma ou outra instituição. Enquanto não formos duros do ponto de vista econômico com empresas que sediem atos discriminatórios e racistas, nada vai acontecer", disse Silva.
Logo após a divulgação da morte de João Alberto, o Carrefour foi desligado da Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial, que reúne 73 organizações signatárias. No mesmo dia, o CEO da rede de supermercados, Noel Prioux, disse que a morte de João Alberto "não pode passar em vão". "Se uma crise como essa está acontecendo conosco é porque temos a responsabilidade de mudar isso na sociedade", afirmou.
Lista suja
Outra proposta discutida pela comissão é a elaboração pelo Congresso de uma lista pública de empresas em que o racismo ocorre comprovadamente para que a população tenha um olhar crítico perante essas marcas.
A deputada Maria do Rosário (PT-RS), também membro do colegiado, explica que a ideia é semelhante à lista suja de empresas que utilizam trabalho escravo.
Além de apoiar ambas as iniciativas, Maria do Rosário defende ser necessário reforçar leis aprovadas que, na prática, não são cumpridas. Como exemplo, cita a lei que estabelece o ensino da história e da cultura afro-brasileira nas escolas. Ela avalia que a educação é um dos principais caminhos para combater o racismo na sociedade.
Mais projetos de lei para o combate ao racismo já apresentados na Câmara são analisados pelos parlamentares em parceria com juristas negros.
Deputados vão a Porto Alegre
Deputados da comissão vão se reunir hoje com familiares de João Alberto, movimentos sociais e autoridades em Porto Alegre. Beto, como era conhecida a vítima, foi morto após ser espancado por dois seguranças em 19 de novembro no estacionamento de um Carrefour na capital gaúcha. Os agressores e uma agente de fiscalização do mercado foram presos.
A polícia investiga o que motivou a agressão que resultou na morte de João Alberto. Durante o velório, o pai dele, o aposentado João Batista Rodrigues Freitas, de 65 anos, pediu que a discussão sobre o racismo seja incluída no currículo escolar. O caso foi comparado a mortes de negros por policiais nos Estados Unidos, como George Floyd.
Em Porto Alegre, os deputados deverão se encontrar com o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, e representantes da Secretaria de Segurança Pública, das polícias civil e militar, da Polícia Federal, do Ministério Público e do Tribunal de Justiça do estado.
Damião Feliciano e Maria do Rosário afirmaram que o CEO do Carrefour Brasil, Noel Prioux, também foi convidado, mas uma reunião com ele ainda não está confirmada.