Por que o Nordeste registra 'enxame' de tremores de terra?
O município de Amargosa (BA), no Recôncavo Baiano, foi atingido por uma série de terremotos, com magnitudes entre 2.0 e 4.6 na escala Richter, desde o último domingo (30). Eles foram sentidos até em Salvador, que fica a 241 km de distância dessa região.
Até ontem (1º), 14 tremores de terra foram captados pelos aparelhos da Rede Sismográfica Brasileira. Os abalos assustaram moradores, embora não tenham ocorrido danos graves.
O mestre em geofísica e técnico em sismologia Eduardo Menezes, do Laboratório Sismológico da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), explica que a atividade sísmica no Brasil é comum. Um dos focos, inclusive, está localizado no Nordeste, que fica na placa tectônica sul-americana, onde há falhas geológicas que causam os terremotos. Entre maio e julho, por exemplo, ocorreram 39 eventos sísmicos na região Nordeste.
"Passamos a observar que existe muito mais tremor no Brasil do que se imaginava —e no Brasil todo. Isso porque, com a criação da Rede Sismográfica Brasileira, agora temos instrumentos e um banco de dados. Cerca de 60% desses eventos acontecem no Nordeste, mas eles perdem em magnitude para os ocorridos em Mato Grosso", diz Menezes, citando que Mato Grosso, Acre e Minas Gerais sofrem com as movimentações que ocorrem na Cordilheira dos Andes, que está na borda das placas sul-americana e de Nazca.
A maior falha geológica do Brasil está localizada no Nordeste. Chamada de Samambaia, ela tem mais de 40 km de comprimento por cerca de 4 km de largura e fica nos municípios de João Câmara, Parazinho, Poço Branco e Bento Fernandes.
Segundo o LabSis, a profundidade da falha varia entre 1 km e 9 km. Próximo a esta foi localizada outra falha geológica, a de Poço Branco, que contribui com a atividade sísmica naquela região.
A organização, da qual a UFRN faz parte, monitora todo o território brasileiro por meio de cem estações sismográficas espalhadas pelo país.
'Enxame' de tremores
Segundo ele, os abalos no Nordeste ocorrem depois que rochas subterrâneas se movimentam, causando grande pressão umas sobre as outras. Essa pressão é liberada com o ajuste de terra nas falhas geológicas.
Como o Nordeste brasileiro é formado por fragmentos de rochas antigas, explica Menezes, existe maior probabilidade de produzirem atividade sísmica. "Os abalos acontecem quando grandes camadas abaixo do solo e de rochas se tornam instáveis e desmoronam."
O chefe do Observatório Sismológico da Universidade de Brasília, Marcelo Rocha, diz que a série de tremores em Amargosa indica a possibilidade de um "enxame sísmico", que é como os especialistas definem uma sequência de tremores de terra em um local. A duração pode ser de dias ou semanas.
"Em geral, o padrão é assim: ocorrem eventos de menor magnitude, que chamamos de precursores. Depois, um evento mais forte —ou às vezes dois—, chamado de principal. Em seguida, réplicas. Esse padrão está sendo observado na região de Amargosa", diz Rocha.
"Como no Recôncavo Baiano não existem estações sismológicas ainda, não sabemos se ocorreram tremores com intensidade menor de 1.5 de magnitude antes desses eventos desde domingo. As estações mais próximas, distantes 220 km, não conseguem captar uma intensidade assim baixa", afirma Menezes.
Na próxima semana, nove estações serão colocadas em Amargosa para passar a medir até as pequenas atividades no subsolo.
Terremotos desde o século 19
Menezes disse que há relatos em jornais antigos apontando que Amargosa e o Recôncavo Baiano já haviam passado por um período de atividade sísmica no século passado.
O tremor mais antigo na região é de dezembro de 1899 e teve magnitude estimada em 3.5 de magnitude. "Nos anos seguintes, até 1920, houve uma intensa atividade sísmica na Bahia, no Recôncavo e suas vizinhanças, mas, posteriormente, a atividade diminuiu", diz.
Menezes relembra que o Brasil já registrou terremotos de alta magnitude:
- Caraíbas (MG) - 4.9 em 2007
- Iraçatuba (CE), de 4.8 em 1989
- Pacajus (CE) - de 5.3 em 1980
- João Câmara (RN) - de 5.1 em 1980
- Mato Grosso do Sul - 6.2 em 1955
"Após o terremoto em 1980, João Câmara teve uma série em 1986 e 1989, onde foram registrados 50 mil tremores de terra", relembra o geofísico.
"Em sismologia é impossível fazer previsões, não é possível saber se esses eventos vão ficar circunscritos às proximidades de Amargosa ou vão iniciar um novo ciclo de intensa atividade sísmica nessa região da Bahia. É impossível saber como a atividade sísmica vai evoluir, podendo tanto ocorrer mais tremores, inclusive de maior magnitude, ou simplesmente esse surto ter fim repentinamente", diz Menezes. "A população dessas regiões sismicamente ativas tem de aprender a conviver"